sábado, 2 de janeiro de 2016

O risco maligno da vaidade

O vaidoso não enxerga alem do próprio ego

É fácil demais cegar as pessoas. Quando falamos cegar, não nos referimos a tirar a visão delas materialmente falando, mas manipulá-las com intuitos de domínio; cegá-las espiritual e animicamente.
É tarefa simples; consiste em obter, com habilidade, a atenção vaidosa delas, massageando-lhes o ego de tal modo, elogiar com tal engenho e arte, que, não mais que uns poucos segundinhos depois, com a vaidade aguçada ou massageada daquele jeito, pulsando nelas, em alta, beirando as esferas, beirando o paroxismo, as pessoas passam a fazer o que gente quer.
Porque ficam elas totalmente predispostas à enganação, à falsidade, seja dito a bem da verdade, a aceitar mentiras de quem elogia. No pequeno e difícil diálogo Íon, Sócrates diz só ter conseguido a “atenção vaidosa de Íon”, a fim de desenvolver sem oposição o seu argumento, depois de ter manifestado a sua “admiração e inveja” por ele. Isto pode ilustrar bem o que estamos a dizer.
Pra ser justo, o envaidecido também não escuta; nem fala. É um insensível. Quem fala e escuta, por ele, é o manipulador, o apologista, que domina, que triunfa, com segundas e terceiras intenções. Quem não é manipulável pela vaidade? O autor deste texto se confessa plenamente manipulável, desde que não logre perceber a manipulação.
Porque o vaidoso ou manipulado não enxerga um palmo adiante do nariz. Eis que, ao abandonar o mundo concreto, se deixa librar voluntária e cabalmente nas asas ilusórias de um sonho dourado. E acha que aquilo é o seu magnífico leitmotiv. Seu tudo. Motivo condutor da vida. Nem resta dúvidas que inconscientemente a gente em geral adora se enganar. Quase que um orgasmo mental, meninos. Tanto que corre o risco de tropeçar e cair, ao caminhar no escuro de si.
Porque o vaidoso é o ser inconsciente da vida; enquanto o humilde é o ator consciente dela. O humilde caminha ao claro e em paz consigo, sem tropeçar. Quando Jesus almeja despertar a luz da humildade que há amortecida em nós, em verdade, verdadeira, quer mesmo é que sejamos atores conscientes da história.
Conscientes das injustiças; das manipulações dos manipuladores. Manipulações dos psicopatas ou sociopatas. Para Jesus, verdadeiro Deus-Encarnado, em Quem o Criador se fez manifestar pra nós, pior cego é aquele que se nega a enxergar. A vaidade inspira cuidados. Urge tomar precauções com ela, serpente que se embosca nas sombras da alma, pronta para o bote fatal.
Hitler sabia manipular ou cegar as massas e por isso empostava a voz, teatral e comicamente, do alto de sua tribuna e dizia ao povo alemão, em linguagem simples e audível, o que ele exatamente queria ouvir, naquele instante, preleções em torno de supremacia racial ariana.
Porque o ego alemão andava, naquela quadra dramática, carente de orgulhos nacionais, por isso mais predisposto a aceitar falsidades. Em geral, falsidades são mais agradáveis de se ouvir do que as verdades; ao passo que estas são desagradáveis ao ouvido. Ocorre que o cérebro humano está programado para aceitar mentiras. Eis que a mentira é uma dama bela e sensual; ao passo que a verdade, uma velha  feia e desajeitada. A qual delas é mais fácil e delicioso dar crédito? À dama bela ou à velha feia?
Mesmo porque, um pouco antes daquele instante, o ego alemão andava lá no fundo do poço. A inflação em alta, corroendo o poder aquisitivo. Um carrinho de supermercado, abarrotado de marcos alemães, sequer comprava um litro de leite.
A realidade ou verdade social não era nada lisonjeira. Era uma gente carente de orgulhos nacionais. Carente de exaltações étnicas. Daí, vinham a calhar aquelas magnas e oportunas preleções mentirosas do chanceler Adolf Hitler em torno de superioridade racial daquela gente, pra levantar o moral da tropa; pan-germanismo; eugenia etc etc. O povo só faltava arrebentar de amor-próprio, inchado.
Marchava resoluta e cegamente para o front, a um aceno ou piscar de olhos do líder. Morria sorrindo, em nome do condottieri. Inchado de egolatria, que constitui o culto exaltado ao eu. “’Eu sou”, dizia o cidadão comum alemão pra si, presumindo-se, “a raça superior; a condutora ariana, como bem assevera o nosso führer, dos destinos humanos”.
E o povo germânico, já de si cheio, já de si presumido pelas sublimes conquistas de sua gloriosa cultura, orgulhoso dos três Bs, isto é, da mais alta expressão da música erudita, Bach, Beethoven e Brahms, manipulado agora, não só permitia como fingia ignorar as atrocidades contra os judeus como também praticava atrocidades. Tudo fruto maligno da vaidade cega!
Ponto final e cuidado com a vaidade!
Comente este artigo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário