As pautas não estão dentro das redações. Elas gritam em
cada esquina. É só pôr o pé na rua e a reportagem salta na nossa frente. Essa
percepção, infelizmente, é a que mais falta aos jornais. Os diários perderam o
cheiro do asfalto, o fascínio da vida, o drama do cotidiano. Têm o gosto
insosso de hambúrguer em série. O crescimento dos jornais depende de uma
providência muito simples: sair às ruas, fazer reportagem. Só isso.
Estive, recentemente, no centro antigo de São Paulo. Um
concerto em homenagem à Justiça, no encerramento do mandato do desembargador
José Renato Nalini na presidência do Tribunal de Justiça, levou-me ao Theatro
Municipal.
Um belo espetáculo.
Deparei-me na saída, às 22h, com uma cidade assustadora: edifícios pichados,
prédios invadidos (o edifício do antigo cinema Marrocos é um favelão), gente
sofrida e abandonada, prostituição a céu aberto, zumbis afundados no crack, uma
cidade sem alma e desfigurada pelas cicatrizes da ausência criminosa do poder
público.
A cidade de São
Paulo foi demitida por seus governantes. E nós, jornalistas, precisamos mostrar
a realidade. Não podemos ficar reféns das assessorias de comunicação e das
maquiagens que falam de uma revitalização que só existe no papel.
Temos o dever de pôr do dedo na chaga. Fazer reportagem.
Escancarar as contradições entre o discurso empolado e a realidade cruel. Basta
percorrer três quarteirões. As pautas estão quicando na nossa frente.
Jornalismo é isso: mostrar a vida, com suas luzes e suas
sombras. São Paulo, a cidade mais rica do país e um dos maiores orçamentos
públicos, é um retrato de corpo inteiro da falência do Estado.
Também o Brasil, um país continental, sem conflitos
externos, com um povo bom e trabalhador, está na banguela.
Os serviços
públicos estão à deriva. Basta pensar na educação.
A competitividade global reclama crescentemente gente bem
formada. Quando comparamos a revolução educacional sul-coreana com a
desqualificação da nossa educação, dá vontade de chorar.
A assustadora falta de mão de obra com formação mínima é
um gritante atestado do descalabro da "Pátria
Educadora".
Governos sempre
exibem números chamativos. E daí? Educação não é prédio. Muito menos galpão. É
muito mais. É projeto pedagógico. É exigência. É liberdade. É humanismo. É
aposta na formação do cidadão com sensibilidade e senso crítico.
O custo humano e social da incompetência e da corrupção
brasileira é assustador. O dinheiro que desaparece no ralo da delinquência é
uma tremenda injustiça, uma bofetada na cidadania, um câncer que, aos poucos e
insidiosamente, vai minando a República.
As instituições perdem credibilidade numa velocidade
assustadora.
Os protestos que tomam conta das cidades precisam ser
interpretados à luz da corrupção epidêmica, da impunidade cínica e da
incompetência absoluta da gestão pública. Há uma clara percepção de que o
Estado está na contramão da sociedade.
O cidadão paga impostos extorsivos e o retorno dos
governos é quase zero. Tudo o que depende do Estado funciona mal. Educação,
saúde, segurança, transporte são incompatíveis com o tamanho e a importância do
Brasil.
Nós, jornalistas, temos um papel importante. Devemos dar a
notícia com toda a clareza. Precisamos fugir do jornalismo declaratório. Nossa
missão é confrontar a declaração do governante com a realidade dos fatos. Não
se pode permitir que as assessorias de comunicação dos políticos definam o que
deve ou não ser coberto.
O jornalismo de registro, pobre e simplificador, repercute
o Brasil oficial, mas oculta a verdadeira dimensão do país real. Precisamos
fugir do espetáculo e fazer a opção pela informação. Só assim, com equilíbrio e
didatismo, conseguiremos separar a notícia do lixo declaratório.
As cicatrizes que desfiguram o rosto de São Paulo e do
Brasil podem ser superadas. Dinheiro existe, e muito. Falta vergonha na cara,
competência e um mínimo de espírito público. Façamos reportagem. Informação é
arma da cidadania. E votemos bem. Seu voto, amigo leitor, pode virar o jogo.
A todos, um feliz Natal!
Comente este artigo.
O que os brasileiros precisam é serem tratados com dignidade, respeito e com justiça. não precisamos de promessas.
ResponderExcluir