Talvez até imagine, comova-se,
solidarize-se. Mas certas experiências são individuais e somente quem as tem
consegue compreendê-las totalmente.
Certo
dia, estava indo à rodoviária pegar um ônibus de Jerusalém a Tel Aviv. Era cedo
pela manhã e, para quem não conhece, há um mercado público bem agradável não
muito longe. Eu passei pelo mercado e, olhando aquelas gostosuras, fiquei
tentado a parar. Olhei o horário dos ônibus e resolvi que se pegasse um lanche
rápido na rodoviária mesmo conseguiria entrar no próximo. Então desisti do
mercado, apertei o passo e segui em frente.
No
caminho, ouço um barulho alto, parecia uma batida, mas não soube identificar
muito bem. Chegando à rodoviária, ouço no rádio que um carro bomba tinha
acabado de explodir – exatamente no local onde momentos antes eu estava parado,
pensando se ficaria ali para comer.
O
sentimento é desconcertante. Na hora, fui até o telefone público e liguei para
os meus pais no Brasil para dizer que está tudo bem. Só com eles na linha sem
entender muito o que eu estava dizendo me dei conta de que eles não sabiam onde
eu estava e ainda não tinha dado tempo para a notícia chegar aos jornais
internacionais, se é que chegaria.
Mais
tarde, vendo as notícias na TV, fiquei sabendo que o terrorista se explodiu
sozinho e não levou mais ninguém. Menos mal. Confesso que, por alguns dias,
aquilo mexeu comigo, a imagem na TV de um carro explodindo, no exato lugar em
que eu tinha parado alguns minutos antes.
Anos mais
tarde, vi na TV que uma pizzaria que eu frequentava também explodiu. Um dos
atendentes morreu, e fiquei pensando depois se eu o tinha conhecido.
Quando
vemos uma notícia sobre algo que mal conhecemos, é extremamente difícil, senão
impossível entender exatamente o que aquilo significa. Eu saí ileso, não tive
um arranhão, mas o objetivo do “terror” é exatamente esse, e posso dizer que me
lembro do sentimento de aterrorizado após o fato.
Seja na
Internet, em livros, palestras ou o que quer que seja, costumamos ver palavras
como superação e resiliência jogadas de um lado ao outro, geralmente bem fora
de seu contexto. Tudo pode ser explicado, tudo pode ser relativizado. Alguém
sempre vai dizer que tem alguém pior que você em algum lugar do mundo. Que tudo
pode ser superado de acordo com a sua mentalidade.
Eu sempre
tive um problema com isso. A verdade é que nossa experiência na terra sempre
vai ser limitada. Você pode saber o que é ter uma bicicleta roubada, eu posso
saber o que é levar um susto desses, alguém pode saber o que é ter uma doença
grave. Por mais que se possam fazer relatos, a experiência subjetiva é de cada
um.
Quem sou eu para dizer que alguém que chora
por que teve uma bicicleta roubada é menos digno do que alguém que lida com
outro problema? Ninguém tem o monopólio sobre a condição humana. Provavelmente,
eu nunca vou saber o que é ser um refugiado de guerra, nem nunca vou saber o
que é perder tudo que tenho por uma queda de barragem.
E é por
isso que fico horrorizado quando vejo julgamentos e justificativas, tanto na
mídia quanto nos famosos “textões" de Facebook. Quando alguém minimiza um
problema como é “apenas uma demissão”, “apenas um problema qualquer”, ou quando
dão opinião realizando um julgamento sobre o que mal entendem, e talvez nunca
vão entender.
Sim, sou
a favor de colocar as coisas em perspectiva. Mas há tempo para tudo. É preciso,
de vez em quando, se dar uma folga e dizer: sou só humano. É preciso, também,
dar uma folga a todos os outros. Somos todos humanos, falhos e cada um com seus
problemas.
Se não
podemos entender a diversidade das experiências humanas, talvez o melhor seja
apenas aprender a respeitar, dar o tempo de cada um, e estender uma mão no
momento de se levantar.
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