Hoje, se sabe que este tipo de aprendizado
durante o sono é quase certamente impossível. Embora estudos iniciais tivessem
sugerido que as pessoas sejam capazes de guardar alguns fatos durante o sono, a
verdade é que os cientistas nunca puderam descartar que elas não tivessem
simplesmente acordado levemente e ouvido a gravação.
Para testar essas suspeitas, Charles Simon
e William Emmons conectaram eletrodos ao couro cabeludo de voluntários e se
asseguraram de que suas 'cobaias' estavam dormindo no momento em que gravações
fossem tocadas. As pesquisas, feitas nos anos 1950, confirmaram as suspeitas:
as pessoas não aprenderam nada do que foi tocado para elas enquanto dormiam.
Apesar de ser impossível ensinar
habilidades do zero a uma pessoa durante o sono, há muitas maneiras, básicas ou
sofisticadas, de ajudá-la a consolidar conhecimento adquirido enquanto
descansa.
Quando dormimos, nosso cérebro pode não
enxergar ou escutar novas informações, mas está absorvendo as experiências do
dia anterior, enviando memórias do hipocampo, onde os cientistas acreditam que
elas se formam, para as várias áreas do córtex, onde são armazenadas a longo
prazo.
"O sono ajuda a estabilizar as
memórias e a integrá-las a uma rede de recordações mais antigas", diz
Susanne Diekelmann, da Universidade de Tubingen, na Alemanha.
Dormir também possibilita a generalização
daquilo que aprendemos, para podermos aplicar o conhecimento em novas
situações.
'Manipulando' sonhos
Assim, vários experimentos têm buscado
estimular o cérebro durante o sono com a finalidade de ajudá-lo a consolidar
fatos e habilidades aprendidos durante o dia.
Entre os métodos existentes para alcançar
esse fim, o mais simples deriva de uma pesquisa realizada no século 19 pelo
nobre francês Marquês d’Hervey de Saint-Denys.
Explorando maneiras de manipular seus
sonhos, ele descobriu que podia evocar certas lembranças com odores, sabores e
sons. E usava esses estímulos durante o sono para ter noites com sonhos mais
prazerosos.
Essa mesma abordagem pode fazer o cérebro
reproduzir, durante o sono, habilidades e fatos adquiridos, reforçando o
aprendizado.
Diekelman fez uma experiência com
voluntários na qual pediu para eles memorizarem uma sequência de objetos
enquanto inalavam um aroma artificial e sutil. Quando os voluntários dormiam, a
cientista borrifou o mesmo aroma nas narinas de alguns deles.
Uma tomografia mostrou que eles apresentavam
uma comunicação maior entre o hipocampo e as áreas do córtex. No dia seguinte,
esses voluntários lembraram de 84% dos objetos na sequência, enquanto o grupo
que não foi submetido ao aroma durante o sono lembrou de apenas 61%.
Upgrade tecnológico
Em um futuro próximo, a tecnologia poderá
oferecer novas maneiras de incentivar os ciclos do sono no cérebro. Cientistas
acreditam que a consolidação da memória ocorre durante oscilações específicas e
lentas da atividade elétrica cerebral. Por isso, estão tentando estimular esse
tipo de onda no cérebro sem acordar o paciente.
Jan Born, da Universidade de Tubingen, é um
dos pioneiros nesse tipo de experiência. Recentemente, Born testou uma espécie
de touca de eletrodos que medem a atividade neural enquanto um fone de ouvidos
toca sons em sincronia com as ondas cerebrais.
"O método aprofunda o sono de ondas
lentas e o torna mais intenso. É uma maneira mais natural de fazer o sistema
funcionar em um certo ritmo", explica.
Já Miriam Reiner, do Instituto de
Tecnologia Technion, em Haifa, em Israel, está elaborando um tipo de
"neurofeedback" que permite aos voluntários controlar sua atividade
neural enquanto estão acordados. Um eletrodo ligado à cabeça dos voluntários
envia sinais a um jogo no qual cada pessoa tem que dirigir um carro com o poder
do pensamento.
Quando o eletrodo registra a frequência
correta de ondas cerebrais, normalmente associada com a consolidação da memória
durante o sono, elas aceleram. A mudança no estado mental é visível. "Me
sinto mais relaxada, como se estivesse em um lugar sereno e bonito", diz
Reiner.
A ideia é dar um impulso à consolidação da
memória logo após o aprendizado, o que faz com que o cérebro funcione melhor
durante o sono.
Pesquisas
Ainda são necessários testes mais
abrangentes e com mais voluntários antes que essas técnicas sejam adotadas no
dia-a-dia. Para Reiner, ainda precisamos nos perguntar se seria correto começar
a manipular as memórias das pessoas, ainda que com boas intenções.
"O sono é um estado vulnerável",
observa ela.
Mas a cientista ressalta que questões como
essa não devem conter o interesse em aprender dormindo.
Em última instância, pesquisas sobre o
assunto podem mudar a maneira como percebemos essa parte tão subestimada de
nossas vidas.
Em uma cultura ocidental onde ser
workaholic é aceitável, o sono às vezes tende a ser considerado uma perda de
tempo que tentamos vencer com uma boa dose de cafeína.
Mas quem sabe um dia comecemos a valorizar
o dormir como uma parte do dia rentável na qual não precisamos fazer nada, a
não ser relaxar.
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