quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Mal Acostumados

Estamos acostumados. Acostumamo-nos fácil com as coisas, com as situações. Eu mesmo! Já me acostumei com o banco quebrado do meu carro. Ando pela cidade todo torto, feito gurizão fazendo marra ao volante, meio de lado, encostado na porta. E essa algia no joelho?! Parece que sempre esteve por ali, doendo, incomodando. Mas não reclamo, já estou acostumado.
Houve um tempo em que as coisas não eram bem assim. Não apenas comigo, mas com a maioria das pessoas. Era difícil se acostumar com certas situações. Quase impossível. Não estávamos habituados, por exemplo, com corrupção desenfreada e vergonhosa. Nem com pedágios abusivos, absurdamente caros. Tampouco éramos, em outros tempos, acostumados com alagamentos semanais, criminosos sendo soltos da cadeia sem cumprir pena, “assaltos” nas bombas de gasolina, mortes em corredores de hospitais, alunos desrespeitando e até agredindo professores, “ficha suja” ocupando cargos eletivos, chacina no trânsito.
 Em outras épocas pintaríamos os rostos, empunharíamos sinetas e cartazes, faríamos passeatas, iríamos às ruas e exigiríamos um basta. Hoje protestamos apenas em campos de futebol, e não é contra o corte de cabelo ridículo que o craque insiste em manter na cabeça e que muitos torcedores copiam.
Sempre ouvi dizer que nos acostumamos fácil com o que é bom. Naturalmente. Porém, começamos perigosamente a nos acostumarmos com situações que seriam impensáveis em outros tempos. Vivemos a época do “normismo”, onde tudo, ou quase tudo, é normal. É normal vermos homens e mulheres com pouco ou nenhuma roupa na novela das sete. É normal vermos homens e mulheres dormindo na calçada sob o rigoroso inverno gaúcho. É normal apanhar o panfleto que nos entregam no Calçadão para logo depois jogarmos no chão, longe da lixeira. É normal esperarmos horas, dias e, muitas vezes, meses por uma consulta médica.
Dia desses fui ao banco. Mais de trinta pessoas esperando atendimento - muitos em pé - que estava sendo feito em dois caixas. Em quarenta minutos três pessoas foram atendidas no caixa especial, sendo que uma delas furou a fila (devia achar normal furar fila). Durante esse tempo o guichê para atendimento normal atendeu uma pessoa, o mesmo cliente que ali estava no momento em que entrei no banco. Um senhor do meu lado disse que não estava avezado com essas circunstâncias e foi procurar o gerente.
Pensei que fosse um turista estrangeiro, porque brasileiro é afeito a fila em banco. Mas não. Era, sim, uma dessas raras pessoas que ainda têm o poder da indignação e que lutam por seus direitos. Voltou o senhor, minutos depois, com a informação de que o gerente nada podia fazer, pois estava sem pessoal. Alguns de férias, outros remanejados para agências do litoral, outro doente. Mas valeu a tentativa e ficou o exemplo. Saí da agência noventa minutos depois, sem ser atendido, e fui consertar o assento do meu carro.
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